História do Casamento

Inês de Castro e Dom Pedro: uma história de amor portuguesa além da vida terrena.

A trágica história de amor entre Inês de Castro e Dom Pedro possui semelhanças com o romance de Romeu e Julieta. Mas, além de não ser uma ficção, temas como o amor incondicional, o exílio, assassinato e vingança, tornam a história muito mais macabra e dolorosa que o texto criado por Shakespeare.

O historiador português Fernão Lopes foi o primeiro a escrever sobre o assunto, cem anos depois do ocorrido, em 1440. Iniciando inúmeros outros relatos, verídicos ou não, que alimentaram o mito de Inês e Pedro. A paixão arrebatadora e corajosa entre dois jovens, a coroação de um cadáver e a dedicação eterna a esse sentimento que simboliza o amor profundo que vai além da vida, são ingredientes suficientes para que a história permaneça viva e faça parte da cultura portuguesa.

 

Dom Pedro era príncipe da Primeira Dinastia Portuguesa, a dos Borgonha, cujos membros governaram Portugal entre os anos de 1139 a 1383. Pouco se sabe sobre sua infância e juventude, mas há relatos de que era um rapaz que gostava de festas, tinha um espírito independente e era um exímio trovador.

Terceiro filho de Dom Afonso, foi alçado a sucessão pela morte dos irmãos mais velhos. Ainda aos nove anos, teve seu casamento acertado pelo seu pai, com a princesa do Reino de Castela, Dona Branca, mas recusou assim que a conheceu. Com isso, acabou se casando com D. Constança Manuel, da nobreza de Castelhana.

A história de D. Constança também foi bastante dramática. Ainda com nove anos de idade, casou com o rei Afonso XI de Castela, mas como não houve consumação do casamento, ele foi anulado. Porém, ela continuou aprisionada até que ele se casasse novamente e a liberasse, para ser negociada em casamento para Dom Pedro. A união nunca foi feliz, já que Dom Pedro se recusou a manter-se em harmonia com uma esposa que ele não escolheu, só a encontrando para consumar o casamento e gerar herdeiros.

Numa dessas raras visitas a esposa, Dom Pedro conheceu Inês, sua dama de companhia. Sua beleza era imponente, como longos cabelos loiros e um “colo de garça”, apelido que recebeu pela beleza de seus contornos físicos. A galega falava muito bem português e era filha ilegítima de um importante fidalgo castelhano, assim como prima distante tanto de Dom Pedro quanto de D. Constância.

No início do romance, Dom Pedro e Inês se encontravam as escondidas em Coimbra, na Quinta do Pombal ou de Santa Clara, que hoje é chamada de Quinta das Lágrimas. Assim como trocaram juras de amor a beira da fonte dos Amores e da Figueira do Amor, que receberam esse novo por serem cenários dessa história.

 

A Tragédia e a Loucura

A intensidade do romance provocou a ira de Dom Afonso, já que D. Constância se via humilhada pelo marido diante da sociedade, assim como era um risco ao trono a aproximação com castelhanos. Com isso, D. Afonso mandou Inês ao exílio, numa fronteira com Portugal, onde o casal continuou trocando cartas de amor e alimentando o romantismo do amor impossível.

Após o nascimento do terceiro filho do casal, D. Constância não resistiu e morreu um mês depois do parto. Lendas afirmam que ela morreu de coração partido, já que o marido amava outra mulher. Mas para Dom Pedro, sua morte foi uma libertação para que pudesse assumir seu amor por Inês, a quem mandou buscar do exílio e a enviou para uma Quinta próxima, onde poderia encontrá-la sempre, até que foram morar juntos e passaram a ser vistos publicamente.

Dom Afonso passou a apresentar novas noivas para Dom Pedro, que se recusava a casar novamente com outra mulher que não fosse Inês. Na verdade, ambos se casaram em segredo em 1353 e foram morar no Mosteiro de Santa Clara. Diante de intrigas da corte, Dom Afonso aceitou o plano de seus três conselheiros, Pero Coelho, Álvaro Gonçalves e Diogo Lopes Pacheco, para que Inês fosse assassinada.

O rei e seus comparsas foram para Coimbra esperar uma oportunidade para cometer o crime e quando Dom Pedro foi caçar, entraram na Quinta e a degolaram diante dos filhos. O folclore popular afirma que antes de caçar, Dom Pedro respingou sangue de seu cachorro no vestido de Inês, causando um mau agouro. E a súplica de Inês para não ser assassinada, fez com que suas lágrimas criassem a Fonte das Lágrimas, cujo sangue supostamente manchou as pedras de vermelho.

Inês foi enterrada pelos assassinos no Mosteiro de Santa Clara. E a partir desse desfecho trágico do amor de Dom Pedro e Inês, que a história ganha contornos macabros e surpreendentes, mitificando o casal.

Dom Pedro jurou vingança e liderou revoltas contra o pai, que gerou uma guerra civil que só terminou quando o monarca morreu e ele próprio ascendeu ao trono em 1357. A lenda diz que Dom Pedro arrancou o coração dos assassinos de sua amada e jurou que Inês seria rainha de Portugal, mesmo depois de morta. Em 1360, anos depois da morte, Dom Pedro mandou desenterrar Inês e levou seu corpo em procissão de Coimbra a Alcobaça, para que fosse enterrado com honras de rainha e ficasse ao seu lado na eternidade.

 

A mitificação do amor além da vida

A obra “Nise Laureada”, de Jerônimo Bermúdez, escrita em 1577, inclui não só a procissão do corpo já em avançado estado de decomposição, mas também uma coroação do cadáver em uma cerimônia tradicional, inclusive com a sua mão sendo beijada pelos nobres. A imagem de um rei insano de amor e saudade, que transgrediu a realidade, gerou inúmeras peças de teatro, óperas, poemas (inclusive um trecho de Os Lusíadas de Camões, tem referência a esse amor), pinturas e muitos outros romances. Assim como a expressão popular “a Inês é morta”, veio exatamente desse contexto.

O amor de Dom Pedro por sua amada torna sua história atemporal, em especial quando o monarca permanece fiel a ela até sua própria morte. Afinal, elementos como amor incondicional, inocência, injustiça, saudade, vingança, morte, dor, amor impossível, política, guerra, trono, monarquia e devoção, se mantém firmes na cultura mítica portuguesa, fazendo com que gerações de casais apaixonados procurem locais como a Quinta das Lágrimas e a Figueira do amor, para renovar votos, fazer juras de amor e buscar a simbologia do local para que o amor seja eterno, tal como o de Dom Pedro e Inês, mas bem distante da tragédia do romance.

 

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